domingo, 15 de julho de 2007

INTERNETES

Terminei uma palestra sobre o uso das novas tecnologias na educação. Alguns questionamentos, algumas dúvidas, palmas e fim. Concluo que foi uma boa palestra. Estavam presentes mais de 70 professores do ensino fundamental e médio. Recolho minhas coisas e me dirijo até o estacionamento. De repente, alguém me chama:
— Professora, posso falar com você?
— Pois não.
— Eu não sou professora, estava ali no café esperando o intervalo, eu sou a que estava servindo o café. Gostei muito da sua palestra. Mas eu tenho uma pergunta?
Sorri e aguardei a pergunta.
— Comprei um computador para o meu filho. Sabe, o Márcio é um bom menino, tira boas notas e mereceu o presente. No final de semana, ele fica na Internet, conversa com os primos. Mas tô preocupada. Ontem ele me deixou um bilhete dizendo que dormiria na casa do seu amigo João e no final escreveu beijo com b-j-u-s. Ele escreveu assim por causa da Internet, né? Isso vai atrapalhar ele nas escritas na escola?
Uma mãe, de repente, me fez a pergunta mais profunda da manhã. Respondo que não, que ele com certeza sabe que na escola terá que escrever de outra forma.
— Mas sabe – continuou ela – o meu medo é que a professora de Português é durona, se ele escrever assim ela pode até gritar com ele. Ele é um menino sensível e sei que ela grita na sala quando corrige os textos e encontra muitos erros. Já pensei em proibi-lo de acessar a Internet.
Disse-lhe que não precisava proibi-lo, que conversasse com ele sobre a forma como ele escreveu beijo. Diga que entendeu a mensagem, mas que ele cuidasse para não escrever assim nos trabalhos escolares, pois a forma como ele escreveu é para ser utilizada no computador.
Ela sorriu e continuou:
— Quer dizer que na Internet ele pode continuar escrevendo assim?
Eu disse que sim, pois era a escrita da Internet.
— Muito obrigada, professora, estou mais aliviada. A professora dele deveria saber disso, né?
Sorri e nos despedimos. Enquanto voltava para casa, pensava na conversa que acabara de ter. Na minha cabeça ficou a frase: “A professora dele deveria saber disso, né?” Neste momento, me ocorreu um estalo: passei a refletir sobre o que os professores deveriam saber sobre isso.

terça-feira, 3 de julho de 2007

Ampliando o conceito de tecnologia

Procurando autores que especificam os fundamentos da tecnologia, percebemos que eles partem primeiramente do conceito de técnica para depois descrever os fundamentos da tecnologia. Em BUENO (1999, p. 81) percebe-se a técnica como integrante e precursora da tecnologia que temos hoje, a tecnologia moderna em suas várias facetas. VARGAS (1994, p. 171), afirma que o homem sem técnica seria abstração tão grande como técnica sem homem e “só é humano aquele ser que possui a capacidade de se comunicar pela linguagem e habilidade de fabricar utensílios pela técnica.” A autora destaca que “a técnica faz parte do cotidiano do ser humano, no agir, no pensar, pois este ao intervir na natureza está produzindo um trabalho que eventualmente, buscou para isso uma técnica que faz parte do ser humano e também, faz parte de seu conhecimento.”
VARGAS (1994) diz que o termo tecnologia surgiu com os gregos e foi muito confundido com a techné:
... a “techné” não se limitava à pura contemplação da realidade. Era uma atividade cujo interesse estava em resolver problemas práticos, guiar os homens em suas questões vitais, curar doenças, construir instrumentos e edifícios, etc. As “techné” gregas, eram, em princípio, constituídas por conjuntos de conhecimentos e habilidades transmissíveis de geração a geração. ... O que, entretanto, designamos hoje, de forma geral, por técnica não é exatamente a “techné” grega. A técnica no sentido geral, é tão antiga quanto o homem; pois aparece com a fabricação de instrumentos... E essa fabricação já corresponderia um saber fazer: uma técnica. (p. 18)
GAMA (1986, p. 205) descreve o que não seria tecnologia:
- Não é um conjunto de técnicas ou de todas as técnicas, e nem é uma sofisticação da técnica. A passagem da técnica para a tecnologia (e esta não exclui a primeira) não é a questão da gradação ou desenvolvimento interno ao campo das técnicas: é a questão que se refere à formação sócio-econômica em que se realiza.
- Não é a “maneira como os homens fazem as coisas” porque, em primeiro lugar, não se distingue desse modo técnica de tecnologia e, em segundo lugar, há muitas coisas que os homens fazem que não são técnicas.
- Não é o conjunto de ferramentas, máquinas, aparelhos ou dispositivos quer mecânicos quer eletrônicos, quer manuais, quer automáticos.
- Não é o conjunto de invenções ou qualquer uma delas individualmente. O avião não é uma tecnologia, como não é o rádios, o radar ou a televisão, muito embora seja esta a acepção mais difundida em marketing.
As duas últimas afirmações, segundo BUENO (1999, p.85) convergem com o pensamento de VARGAS:
... o uso da palavra tecnologia referindo-se a máquinas, equipamentos, instrumentos e sua fabricação, ou a utilização ou manejo deles. É verdade que há uma tecnologia embutida em qualquer instrumento e implícita em sua fabricação; mas isto não é razão para se considerar o saber embutido num objeto, ou implícito na sua produção, com o próprio objeto da industria. Um derivado desse mal uso é o emprego da palavra tecnologia para significar a organização, o gerenciamento e, mesmo, o comércio desses aparelhos. Por uma razão ou outra essa confusão apareceu na área da computação e da informática, onde a máquina é tão importante quanto o saber de onde ela se originou. Há, então, o perigo de se confundir toda a tecnologia, isto é, o conhecimento científico aplicado às técnicas a aos seus materiais e processos com uma particular indústria ou comércio.
Desta forma BUENO conceitua tecnologia como sendo:
... um processo contínuo através do qual a humanidade molda, modifica e gera a sua qualidade de vida. Há uma constante necessidade do ser humano de criar, a sua capacidade de interagir com a natureza, produzindo instrumentos desde os mais primitivos até os mais modernos, utilizando-se de um conhecimento científico para aplicar a técnica e modificar, melhorar, aprimorar os produtos oriundos do processo de interação deste com a natureza e com os demais seres humanos. (1999, p.87)
O termo tecnologia vai muito além de meros equipamentos. Ela permeia em toda a nossa vida, inclusive em questões não tangíveis. TAJRA (2001, p. 48) cita Sancho quando ela classifica as tecnologias em três grandes grupos:
Tecnologias físicas: são as inovações de instrumentais físicos, tais como: caneta esferográfica, livro, telefone, aparelho celular, satélites, computadores. Estão relacionadas com a Física, Química, Biologia, etc. (equipamentos)
Tecnologias organizadoras: são as formas de como nos relacionamos com o mundo; como os diversos sistemas produtivos estão organizados. As modernas técnicas de gestão pela Qualidade Total é um exemplo de tecnologia organizadora. (relações com o mundo)
Tecnologias simbólicas: estão relacionadas com a forma de comunicação entre as pessoas, desde a iniciação dos idiomas escritos e falados à forma como as pessoas se comunicam. São os símbolos de comunicação. (interfaces de comunicação)
Consideramos que estas tecnologias estão intimamente interligadas e são interdependentes. Ao escolhermos uma tecnologia, estamos intrinsecamente optando por um tipo de cultura, a qual está relacionada com o momento social, político e econômico no qual estamos inseridos. Analisaremos os conceitos explicitados pelos professores pesquisados considerando a classificação de SANCHO (2001).
Referências:
BUENO, Natalia de Lima. O desafio da formação do educador para o ensino fundamental no contexto da educação tecnológica. Dissertação de Mestrado, PPGTE – CEFET-PR, Curitiba, 1999.
GAMA, Ruy. A tecnologia e o trabalho na história. São Paulo: Nobel; editora da USP, 1986.
VARGAS, Milton. Para uma filosofia da tecnologia. São Paulo: Editora Alfa Omega Ltda, 1994.